Tromba sobre terra

Desenvolvimento de uma estrutura do tipo supercelular na tarde de 17 de setembro de 2014

De acordo com as análises do modelo de circulação geral do ECMWF para as 12 UTC do dia 17 de setembro, a situação meteorológica é caracterizada por uma depressão centrada a oeste da Galiza (figura 1a) que se estende desde a superfície até ao níveis superiores da troposfera, à qual está associado um jato ⁽¹⁾ aos 300 hPa (figura 1b). O ramo ascendente do jato posiciona-se sobre as regiões do Continente situadas a sul do paralelo 40ºN, onde existe um aumento da adveção de vorticidade positiva em altitude (carta da adveção de vorticidade não apresentada) que, pela equação w, contribui para o movimento vertical ascendente (expresso pelos valores negativos da velocidade vertical aos 700 hPa – figura 1c), o qual constitui um dos principais fatores na formação de nuvens e ocorrência de precipitação.

Nos níveis inferiores, a circulação é de sudoeste e transporta uma massa de ar quente e húmido (valores da pseudo-temperatura potencial do termómetro molhado aos 850 hPa compreendidos entre 14 e 16ºC – figura 1d) e de natureza instável (valores máximos de CAPE entre 700 e 1000 J/kg – figura 1e).

Figura 1 – Análises das 12 UTC do dia 17 de setembro de 2014 do modelo do ECMWF: (a) Pressão ao nível médio do mar (isóbaras em intervalos de 4 hPa – a azul) e geopotencial aos 500 hPa (isolinhas em intervalos de 4 damgp – a vermelho); (b) Vento (> 30 kt) e Isotáxicas (> 60 kt) aos 300 hPa; (c) Velocidade vertical aos 700 hPa (Pa s-1); (d) Pseudo-temperatura potencial do termómetro molhado (ºC) aos 850 hPa e pressão ao nível médio do mar (isóbaras em intervalos de 4hPa); e) Índice de estabilidade CAPE (ºC).

Consequentemente, existem três fatores às 12 UTC (13 horas locais) que favorecem a ocorrência de convecção profunda: movimento vertical ascendente, ar húmido em níveis baixos da troposfera e instabilidade atmosférica.

Para além dos três fatores mencionados averiguou-se sobre a existência de um quarto fator, o Wind Shear (WS) em várias camadas da troposfera, já que a sua existência adicional é necessária para o desenvolvimento de um tipo de convecção mais organizada, como por exemplo uma estrutura supercelular, que propicia a ocorrência de fenómenos meteorológicos extremos do tipo tornado. De salientar que a análise das observações de velocidade Doppler do radar de Coruche/Cruz do Leão permitiram identificar no período em causa nos arredores de Ansião/Avelar uma estrutura de tipo supercelular em evolução de sudoeste para nordeste. Assim, partindo das análises das 12 UTC do modelo do ECMWF, calcularam-se para Avelar (ponto de coordenadas 39.92 N 8.36 W) os valores de WS entre a superfície e vários níveis de altura (1 km, 3 km e 6 km) para além dos valores dos índices de estabilidade CAPE, CIN e LI (tabela 1).

A comparação dos valores calculados para os índices com os obtidos para um conjunto de 8 situações em que ocorreram tornados em Portugal continental permite incluí-los no intervalo de valores dessas situações. Contudo, a inexistência de relatos de destruição no solo e de fotos e/ou vídeo que comprovem o contacto de uma circulação de tipo turbilhonar com o solo impedem uma classificação fidedigna do fenómeno. Parece ter-se tratado de uma circulação associada a uma nuvem-mãe que, no limite, poderá ter sido um tornado se tiver tocado o solo ou um lowering se tal não se tiver verificado, o que não foi possível apurar no presente caso.

⁽¹⁾ Considera-se a definição de Kurz (1998) para jato, segundo a qual este é identificado pela região da atmosfera em que a intensidade do vento é igual ou superior a 60 kt.