Tornado Vila Chã, Vila do Conde, 10 de Abril de 2016

No dia 10 de Abril de 2016, ocorreu um episódio de vento forte à escala local em Vila Chã, Concelho de Vila do Conde, que provocou estragos consideráveis em algumas habitações e instalações agropecuárias. De acordo com os elementos disponíveis, esta destruição ter-se-á traduzido essencialmente por destelhamentos, danos em janelas e muros, tendo sido igualmente registada destruição em árvores. A natureza dos danos revela consistência com estragos tipicamente produzidos por um tornado. A natureza dos danos verificados por via documental sugere ter-se tratado de um tornado F1/T2 (rajada 3s, na gama 33-42 m/s). “F” designa a escala de Fujita clássica e “T” a escala de TORRO (TORnado and storm Research Organization).

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Figura 1– Imagem de PPI (elevação 0.0º) de intensidade de precipitação do radar de Arouca às 06:46UTC do dia 10 de abril de 2016. Padrão de eco em arco, associado à formação de mesovórtices sobre a o litoral norte (um dos quais assinalado com seta a branco).

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Figura 2 – Imagem de PPI (elevação 0.0º) da velocidade em relação à tempestade do radar de Arouca às 06:46UTC dia 10 de abril de 2016. Assinalado dipolo de rotação (mesovórtice) a vermelho, provavelmente associado ao tornado que ocorreu em Vila chã. Igualmente assinalados a preto outros mesovórtices que integravam o sistema convectivo quasi-linear.


A escala planetária/sinóptica era caracterizada pela influência do ramo ascendente de uma depressão baroclínica que se estendia até aos níveis altos da troposfera, e à qual estava associado um jacto ao nível dos 300hPa que afectava as regiões Norte e Centro durante a madrugada e manhã do dia 10 de abril de 2016. Valores muito significativos de advecção diferencial de vorticidade entre os níveis dos 300 e 500hPa, sugeriam forte forçamento de larga escala sobre as regiões a norte do sistema montanhoso Montejunto-Estrela no referido período. Ao nível dos 500hPa podia identificar-se advecção fria sobre a referida região, o que poderia eventualmente sugerir numa porção relativamente extensa da atmosfera, a existência de um gradiente vertical de temperatura igual ou superior ao adiabático saturado, ou seja, uma atmosfera instável ainda que de forma marginal ou condicional.

À escala sinóptica/mesoescala era sugerido forçamento associado a uma zona baroclínica, de transição entre um TetaSw polar (8/10ºC) e com valores de TPW de 17,5/20mm e uma região de TetaSw polar/com características termodinâmicas de ar ártico (4/6ºC) e com valores de TPW inferiores a 12,5mm, e que se poderia eventualmente identificar como uma superfície frontal fria/linha de instabilidade/zona de convergência (figura 4).

Ao n.m.m (figura 5), e especialmente sobre o litoral Norte e Centro, podia inferir-se vento su-sudoeste a variar entre 20 e 25kt, enquanto nos níveis isobárico dos 500hPa (figura 3) e dos 300hPa o vento era tipicamente de sudoeste a variar respectivamente entre 55 e 65kt, e entre 80 e 90kt. Ao nível dos 850hPa, podia inferir-se vento de sudoeste a variar aproximadamente entre 35 e 50kt no referido litoral. Assim, seria expectável nessa região, uma atmosfera fortemente shearizada em profundidade, essencialmente com shearing, assim como até aproximadamente aos 1500 metros de altitude, camada onde se podia igualmente identificar uma ligeira advecção quente associada a um ligeiro veering.

Ainda que a atmosfera apresentasse valores da CAPE supostamente marginais, a referida superfície frontal fria/linha de instabilidade/zona de convergência poderia ter contribuído de forma muito significativa para o forçamento de mesoescala por forma a permitir o estabelecimento de updrafts associadas a nebulosidade convectiva. A interacção entre as supostas updrafts e a vorticidade horizontal associada ao forte shearing nos níveis baixos poderia estar na base da conversão de vorticidade horizontal em vorticidade vertical em níveis relativamente baixos (abaixo dos 3 km), situação que é compatível com a formação de mesovórtices, evidenciados nas figuras 1 e 2. Adicionalmente, poder-se-á pensar que a vorticidade vertical nos níveis baixos poderia pré-existir associada à referida região baroclínica, facto que é igualmente compatível com a formação de mesovórtices junto à superfície, associados a perturbações de um sistema convectivo quási-linear. A eventual interacção entre a vorticidade vertical pré-existente junto ao solo e a conversão de vorticidade horizontal em vorticidade vertical em níveis relativamente baixos resultante do forçamento associado à região baroclínica, poderá ter estado na origem da formação dos mesociclones organizados linearmente. Sabe-se que estes mecanismos são susceptíveis de originar tornados, ainda que habitualmente sejam de menor duração e intensidade que os originados pela convecção supercelular.


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Figura 3 – Nível isobárico dos 500 hPa: Geopotencial, temperatura e vento, válido para dia 10 de abril 2016 às 06UTC.

 

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Figura 4 – Campo do TetaSw ao nível isobárico dos 850hPa, válido para dia 10 de abril às 06UTC.

 

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Figura 5 – Pressão ao nível médio do mar e vento a 10m, válido para dia 10 de abril 2016 às 06UTC.